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quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Silêncio

O Silêncio O filme O silêncio (1998), dirigido por Mohsen Makhmalbaf, foca-se no seguinte personagem: Korshid, um garoto cego. Ao estabelecer esse centro de abordagem, "o garoto cego", tenta ressaltar em primeiro momento imagético o fato de que tem uma sensibilidade excepcional. Justamente em função dessa aguda e crônica sensibilidade, essa personagem é capaz, bem mais do que as outras que no filme entram em jogo, de se relacionar com a exterioridade (sociedade + meio ambiente) de uma forma bastante especial, peculiar. A sensibilidade aflorada (órgãos dos sentidos à flor da pele) é, para aquele garoto, um suporte fundamental por meio do qual se torna possível intuir com as prescrições do coração a vida ao redor, com toda a multiplicidade que dela faz parte (pessoas, música, natureza etc.). E para além de sentir aquilo que o circunda, o protagonista é capaz de exprimir sob forma de voz ou gestos musicais (mediados pelos sentidos ou a eles fazendo alusão) suas próprias posições no mundo, acrescendo ao próprio mundo os impulsos da criatividade a ele, ao garoto, inerentes - tal como se fosse uma "flecha luminosa" capaz de assentar isto: uma novidade a qual ainda não é dada no meio com o qual se relaciona

Com efeito, o garoto do filme, para além de possuir extrema sensibilidade, é capaz de desenvolver correlativamente uma ciência acerca daquilo com o qual se relaciona, qual seja: o mundo ao seu redor, concretizado sob diversos matizes ou camadas fenomênicas de vida. Essa ciência, conhecimento ou saber como algo análogo àquilo que sente, além de ser meio de consciência de si e dos outros, expande-se e "encarna-se" nas expressões do próprio garoto, ou seja, a música, o discurso, os gestos, através dos quais se relaciona eticamente com pessoas e meio ambiente. Portanto, o garoto do filme é indivíduo que tem, à diferença da maioria, ciência: saber especial que se decorre dos seus sentidos. Todavia, não é qualquer ciência que aqui está em pauta. À diferença de tentar encontrar verdades ou conhecimentos intrínsecos ao próprio universo, o garoto, à medida que com a exterioridade se relaciona, busca se autoconhecer ao passo que sente afetivamente a exterioridade, e decerto por isso é capaz de promover, como ressonância, conteúdos ou novidades conceituais sobre e no universo local do qual faz parte. 

Conclusão: ciência e imaginação (ficção ou fabulação) andam juntas. Tal percurso, o da ciência ou imaginação, é um objeto intrínseco aos seres humanos, e para o qual têm de se voltar como aquilo que possuem de mais especial (sejam adultos ou crianças). Com efeito, abdicar da postura do incentivo da ciência ou imaginação - como expressão fabuladora das crianças a respeito do mundo com o qual interagem - nas escolas é impedir a adequada educação das crianças, contribuindo, do contrário, para que se tornem infames espelhos ou réplicas das inautênticas perfídias sociais. Tal é o papel político docente, o qual DEVE primeiramente se [auto]educar nos caminhos metamorfoseantes do autoconhecimento cidadão ou ético (tal como Korshid, garoto cego do filme O silêncio, ensina); para, apenas mediante essa condição, possuírem de modo maduro a legitimidade da educação das crianças.

Por fim, algo que podemos problematizar nesse sentido é a questão de se realmente a nossa sociedade estaria pronta para esse tipo de formação educacional, porquanto ela é em sua natureza, tanto quanto àquela do filme assistido, extremamente repressora, agressiva em termos econômicos e impositiva quando faz alusão ao mundo do trabalho, impossibilitando no mais das vezes a potencialização dos mecanismos criativos os quais são parte da estrutura conjuntural das crianças, lutando assim, como contrapartida, pela servidão formativa dessas últimas ao invés de auxiliá-las à prática da liberdade. 

Mesmo tendo em vista a complexidade dessa exposição, é algo de que não podemos abrir mão, mesmo enfrentando problemas paralelos, haja vista que devemos superar, e não simplesmente reproduzir, a realidade que costumamos trazer em nossas mentalidades, correlativas às heranças das tristonhas escolas e estrutura social nas e pelas quais nos formamos. Apenas por meio disso poderemos ter um aprendizado significativo. As CRIANÇAS, bem como NÓS dependemos disto: do questionamento do atual ou do futuro professor a respeito do modo como se exprime na vida. 

Ao fim e ao cabo, talvez seja justamente essa a grande contribuição do filme O silêncio, ou melhor, de Korshid, para nossa própria educação, a qual não deve sob hipótese alguma se sintetizar em uma série de técnicas assimiladas, memorizadas como fórmulas de vestibular que nos deseducam e desumanizam na e para a sociedade, já que tais fórmulas impedem de sermos aquilo que realmente somos: humanos, demasiadamente humanos nos impulsos éticos para com nossas singularidades originais. Se disso abdicarmos, simplesmente nos igualaremos ou nos identificaremos com/em medíocres modelos prontos, e, com efeito, contribuiremos desatinadamente para a deseducação das crianças, tornando-as corruptas tanto quanto nós, decerto por compactuarem no futuro com a decadência social inerente à barbárie de nossos homogêneos egoísmos rotineiros. 

 GuajupiáEmTerrAfogado

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